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Os meus, os seus e os nossos - A Universalização do Particular.

  • Foto do escritor: Mar
    Mar
  • 8 de mai.
  • 17 min de leitura

“Na minha experiência”

“No que eu já tenha visto”

“Mas eu conheço uma pessoa que”



Uma vez fiz um curso sobre o que significava “Ser Humano” para uma determinada corrente psicológica chamada “Behaviorismo Radical”. O curso foi ótimo e me inspirou a escrever diversas coisas (ainda serão postadas) e a refletir sobre o tema de hoje “A Universalização do Particular.”


Então hoje vou explorar os seguintes assuntos:

  • O curso e uma definição de ser humano de acordo com o Behaviorismo Radical

  • A questão do Singular, Particular e Universal.

  • A universalização do particular de uma forma mais individual.

  • A universalização do particular de uma forma mais sistemática.

  • Outras reflexões e desafios.

  • Conclusões



O CURSO:

O que é ser humano para o Behaviorismo Radical - O Panorama Histórico do Curso

Vou deixar o título bem grande porque esse post vai ser grande e com muitos subtópicos. Além disso, muito do que foi escrito aqui é parte também das minhas próprias reflexões e em como me relacionei com o curso, nem tudo escrito abaixo foi falado no curso propriamente dito, mas esse curso impactou diversas reflexões abaixo citadas.

Primeiramente preciso dizer que a professora que ministrou o curso é fantástica! Incrível mesmo! Dadas as enaltações, vamos lá.

A professora começou com uma crítica no meio do Behaviorismo e do campo da ciência psicológica como um todo que tende a secundarizar as discussões sobre a natureza humana e o que significa ser humano em detrimento de todas as outras discussões, tendo esse termo como uma concepção pouco explorada. O que sinceramente, concordo plenamente, muitos podem achar essa discussão desnecessária, mas acredito que uma concepção de ser humano (ou pelo menos, um norte nas estruturas básicas para conceitualizar um ser humano) é super importante para primeiro pensar justamente no objeto da psicologia que é o ser humano e segundo que tipo de ser humano e sociedade queremos construir a partir disso, ou quais são os próximos passos.

Depois, a professora fez uma pergunta provocadora para iniciar a discussão: "O que te diferencia de uma pedra?".

E em seguida apresentou os itinerários, que seria basicamente um panorama histórico sobre a concepção de humano na modernidade (humanista, positivista) e depois a crítica enquanto a isso e por fim a concepção dela de ser humano.

Vale dizer aqui que não concordo completamente com a visão do behaviorismo radical sobre ser humano, mas independente disso, não é uma questão de concordar, mas entender as visões e esse curso deu uma boa ideia para mim de algumas concepções humanas ao longo da história e algumas aproximações com a psicologia soviética (que é a minha favorita, por enquanto).

Num primeiro momento, temos o ser humano como um ser racional, separado da natureza mecanicista pelas suas faculdades mentais, possibilidade de reflexão e por fim, liberdade individual (vemos aqui o início das discussões do direito individual e das possibilidades de autonomia e etc). Humano como maquinário é questionado nessa época (o que é engraçado para mim, porque nessa hora ela falou que muita gente ainda tem uma visão moderna de ser humano, e eu acredito que muita gente ainda tem o ser humano como uma MÁQUINA (ou um supercomputador? xD), o que é ainda mais antigo que essa definição dada aqui).

Então, se é colocado o ser humano separado da natureza como um ser autônomo e que age sobre o mundo através da razão. SE diferenciando da natureza pela razão. E por isso descontextualizado da história e universalizado.

Essa visão foi criticada por uma perspectiva que considera o ser humano não como sujeito, mas como objeto incognoscível. Perceba que há um salto copernicano aqui. Se antes o ser humano era capaz de ser completamente livre e autônomo, agora o ser humano é completamente preso às suas determinações contextuais e inconscientes.

Recapitulando então:

  • Ideia do homem como máquina, mecanicista, sem diferenciação das ciências exatas.

  • Ideia do homem como ser racional, livre pela sua razão, diferenciação total com a natureza.

  • Ideia do homem como ser irracional e inconsciente, negação da ideia do homem como ser racional.

Outro ponto de destaque é que independente da ideia vigente, é que elas são limitadas e que é por isso que a professora vai criticá-las. Além disso, as ideias em si não são bem marcadas e separadas também ao longo da história, isso porque as coisas acontecem de forma gradual.

Uma coisa importante nesse minicurso é que a professora trás uma crítica interessantíssima para os impactos da ideia do homem como ser racional (que é, muitas vezes, a forma mais refletida atualmente no mundo).


Críticas da Concepção do Humano RACIONAL:

  • A partir do momento em que se cria uma ideia de ser humano, principalmente com os ideais racionais e "livres", tudo aquilo que se diferencia dessa lógica é tirado de seu caráter humano e objetificado.

  • Também é importante lembrar que quem era considerado como humano genérico era o Homem (branco, europeu, cristão) e tudo aquilo se diferenciava dele nesse momento era tido como irracional e subhumano. Até mesmo hoje em dia isso se extrapola do ideal para o concreto, o intelectualismo se coloca como uma função humana não só de maior complexidade como de maior VALOR.

  • Portanto, todos aqueles que se diferenciam do conceito de humano moderno (racional) não apenas é colocado como ser de segunda classe como também pode ser explorado por aqueles da primeira.

Exemplos práticos de populações que são colocadas como seres humanos de segunda classe a partir desse perspectiva com citações reais de filósofos importantes: mulheres, crianças e povos não-brancos.

Quanto às mulheres:

“Tanto na ciência quanto na nossa cultura, a masculinidade é identificada com o lado da cultura e a feminilidade com o da natureza” (Harding, 1987, 1993. p.24)

“Todo progresso é devido ao homem. Portanto a mulher é como um peso morto para ele, também o restringe de ações nobres, pois ela é incapaz de distinguir o bem do mal. Se a mulher não fosse física e mentalmente fraca, se ela não fosse em regra, tornada inofensiva pelas circunstâncias, ela seria exrtemamente perigosas. (Mobius, 1901, p.629 e p.630).

Eu nem vou comentar essas frases, vou apenas deixar como sensibilização ao leitor (são absurdas e eram ditas como se não fossem nada). Além de que essas ideias AINDA ESTÃO PRESENTES.

Povos não-brancos:

"Os negros da África não possuem por natureza algum sentimento que se eleve acima do ridículo." - Kant (sim, o tão querido pai da ética alemã kkkkkkkk ok ok há de se jogar a água suja e não a criança, mas nossa completamente absurdo!)

Aqui também se colocam povos árabes, asiáticos e indígenas (esse último visto como FAUNA e portanto passível de ser explorado).

Todas essas populações, ao considerarmos o ser humano como esse ser Racional e Autônomo, são postas como seres que se aproximam da natureza e portanto se diferenciam do ser humano propriamente dito, ou em outras palavras são naturalizados e vistos como parte de um 'mundo selvagem' a ser dominado. Essa lógica justificou desde a escravidão até a esterilização de pobres no Brasil dos anos 1990. (SIM ANOS 90!!!!!!!!!!!!!!!)

Lembro que a professora colocou uma linha em que um lado estava o SER HUMANO e no outro a NATUREZA, e que esses outros eram colocados como desumanos, segunda classe de humanos OU ATÉ meio humanos, como no caso das crianças, que são humanos "incompletos" ainda sem desenvolvimento.

Existem mais UM MILHÃO de coisas para se falar nessa parte de críticas, mas vamos deixar para outro momento porque temos tempo de explorar isso com mais calma em posts específicos sobre esses temas.


Críticas da Concepção do Humano IRRACIONAL:

  • Provavelmente com o advento da psicologia Freudiana e a passagem para uma psicologia mais "humanista", ou até baseadas no construcionismo. Portanto algumas das teorias pós-modernas são uma espécie de contracultura da ideia do homem racional propondo uma ideia de homem IRRACIONAL, o que em certos momentos também limita as possibilidades humanas em torno de um tipo de bohemismo irresponsável e talvez (polêmica), pouco científico.

  • Além disso, ao ter uma visão de que o ser humano é incognoscível, partimos de um pressuposto em que vale tudo e esse vale tudo pode ser perigoso, assim como as definições engessadas podem levar à uma exploração e controle dessa natureza humana, ao colocá-la como incognoscível e misteriosa (até mágica e etérea), podemos cair numa armadilha de não fazermos as perguntas corretas e tomar como determinado a própria indeterminação. A insistência em reduzir o ser humano ao inconsciente, aos impulsos ou a uma suposta natureza caótica e inefável não resolve o problema da universalização, até porque, dizer que "o humano é irracional" é tão generalizante quanto afirmar que ele é puramente racional. E no fim, ambas as visões ignoram a complexidade histórica, social e material que nos constitui. (mas daí já estou falando demais minha própria opinião kkkk).

  • Se romantizarmos a irracionalidade como essência humana, então cometemos o erro de abandonar a ciência da investigação e a tarefa pensar os nossos padrões que organizam até mesmo nosso caos, como se emoções e desejos fossem "forças mágicas", e não fenômenos com lógicas sociais e biológicas (quero MUITO fazer um post apenas sobre lógica e emoção ou lógica das emoções?).


Pequena Crítica Geral:

Essa parte não estava no curso, mas gerou essa reflexão.

  • Em ambos os casos há uma justificação da inação (política principalmente), o que em última instância cria uma falta de propósito generalizada.

  • Não falei muito do mecanicismo aqui (e nem quero, porque quero fazer um post só sobre isso e também como essa ideia se renova ao longo do tempo). Mas de certa forma, as 3 ideias são fatalistas e caiem no inevitável. No caso do mecanicismo vem da ideia dos conhecimentos das ciências naturais como determinante nas relações, "as coisas são assim, porque funcionam assim".

  • No caso do racionalismo, há um verniz de individualização intelectual para além da naturalização, com uma ideia de "se não agem racionalmente, merecem sua condição" ignorando como a própria noção de "razão" foi historicamente moldada para excluir e limitar as diversas formas do ser humano ser e interagir no mundo.

  • E por fim, no caso do ser humano irracional, caímos naquela de "nada pode ser conhecido ou mudado", e tendemos a acreditar que isso é ser livre. Porém, muitas vezes essa postura não é liberdade mas uma forma de rendição, porque nos desobriga a tentar entender e compreender o ser humano em sua plena diversidade e nos coloca em uma "passividade".

    E por fim deixo a pergunta: Quem se beneficia quando aceitamos cada uma dessas visões e cruzamos os braços perante às injustiças ou as concepções?


Agora vamos para a concepção de ser humano proposta por essa professora em uma visão mais BEHAVIORISTA (radical).

A reconstituição da noção de humanidade NO COMPORTAMENTO. Comportamento como relação entre atividades de um individuo e seu mundo natural.

Discussão neste mundo NATURAL e não sobrenatural. Porém pressupõe um mundo natural complexo. Um ponto importante é a "des" cisão da natureza com o ser humano a partir de uma concepção menos mecanicista da natureza, mas como um fenômeno criativo baseado em contingências (e relações) e não em mecanicismos ou necessidades.

Há algumas afinidades entre Comportamentalismo radical e anti-humanismo, principalmente no que diz respeito ao controle, em que uma pessoa nunca se torna verdadeiramente autossuficiente. E que não é possível viver sem esse controle (a diferença é que pode ser opressiva OU não) e portanto, agir em forma livre é agir em contexto.

Então, nessa perspectiva o ser humano não está desconectado da natureza, mas ali pertence e daí temos a pergunta que não quer calar: O que é ser humano na perspectiva behaviorista radical de acordo com essa prof maravilhosa?

O ser humano é um ser tridimensional que compõe em si 3 níveis de seleção.

(comportamental, porque estamos falando da ciência do comportamento):

  • Primeira história é a filogenética e tem uma temporalidade de milhares de anos, sendo a ordem de sobrevivência da espécie, isso é, um compartilhamento de características com outros membros da espécie que nos diferenciam de outras espécies (não somos pedras ou árvores, se lembram?).

  • Organismo UNICO.

  • A segunda história diz respeito ao papel da sociedade na vida do sujeito, isso é, a sobrevivência das características culturais e grupais de um grupo que o distinguem do outro. Parte de uma identidade social construída com uma temporalidade de centenas de anos.

  • E a última história é a ontogenética que diz respeito à vida e experiência singular e particular de cada indivíduo, portanto sua temporalidade se limita também em seu tempo de vida. Depende dos processos comportamentais.


Por fim deixo aqui algumas anotações (não vou explicar) que fiz no dia do curso.


O que é o ser humano?
Organismo
Identidade social
Personalidade e “eu”
Como é o ser humano?
- “O homem que o homem criou é o produto da cultura que o homem criou”. (Skinner, 1971, p.208)
"Cultura ocidental moderna também criou condições para constituir uma noção de humanidade compatível com a destruição, esgotamento de recursos e exploração" (skinner, 1978, 1986)
- Qual humano queremos ser? Quais atributos queremos que nos definam como humanos?
- ser humano humanista
- interessada no futuro da humanidade 
- trabalha mais eficazmente para o bem do indivíduo, em benefício do maior número de pessoas e para o bem da cultura ou da humanidade como um todo
Um ser humano humanista precisa de uma cultura humanista
- Reinsere o ser humano na natureza (não mecanicista) 
- Estabelece atributos humanos definidos na relação indissociável com o mundo natural (vital, psicológica e cultural) 
- Inclusiva e respeita a diversidade humana e não-humana. (crianças, mulheres, idosos, não heteros, etc)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O que temos considerado como “ser humano”? Ressonâncias da concepção moderna de humanidade: humano é definido em oposição a uma natureza mecanicista ciencia/subjetividade/comportamento humana
Criticas a concepção moderna
- Situar a psicologia no debate das críticas anti-humanistas e dos estudos de generos e etnico-raciais à concepção moderna
Comportamentalismo radical ou Humanismo comportamental?

Após essa longa explicação sobre algumas perspectivas do que é o ser humano, senti falta de falar um pouco da concepção de ser humano a partir da perspectiva histórico-cultural ou sócio-histórica proposta por essa outra corrente psicológica. Mas acredito que ao falar dessa concepção, eu teria que explicar MUITAS outras coisas que não caberiam aqui, e por isso então vou postar em algum momento mais essa outra concepção de ser humano (que é a que eu mais sinto afinidade apesar de eu gostar MUITO e ver bastante coerência e honestidade intelectual na concepção que essa professora postou). Também quero postar um desabafo mais pra frente sobre o quanto de humanidade perdemos ao silenciar mulheres ao longo da história. Enquanto essa professora falava eu pensava, puxa vida, que mulher incrível.


Essa introdução foi tão longa que poderia ser transformada em um post próprio, mas sinceramente não vou fazer isso porque 1. tira da minha programação e linha de raciocínio e também não estou aqui pelos números de posts, mas pela qualidade e coesão entre eles. Se tava planejado, ok, mesmo que seja um pouco mais longo que o normal.


Agora podemos falar sobre o post propriamente dito, com uma breve explicação dos níveis de análise "singular, particular e universal" que não tem a ver com diretamente com a noção de humano comportamental mas vai servir como fio condutor para todas as discussões seguintes que são o cerne do post de hoje. Um adendo é que a parte que nos toca na discussão anterior, para além da tão interessante noção do ser humano é em como as discussões e concepções universalizam os seres humanos e os cristalizam como se fossem comuns à todas as épocas, contextos e situações. E é justamente isso que critico hoje. Como uma coisa particular se torna universal a medida que concebemos certas concepções de humano como verdadeiras (e principalmente e infelizmente IMUTÁVEIS).



Ok,

O que é singular, particular e universal?

Eu não sou especialista, mas pelo que eu entendo, essas três ideias são "Ferramentas de Análise" que permitem observar a realidade através de várias "lentes". Essas ferramentas (ou unidades, que seria o termo mais preciso) são categorias, nas quais podemos perceber e compreender melhor os fenômenos.

Singular - Se refere ao indivíduo concreto, único, determinado, imediato. Nesse caso estamos falando de coisas específicas. A unidade mínima da análise ali.

Particular - Aqui estamos falando de uma categoria um pouco mais abrangente do que a anterior, mas ainda assim uma coisa concreta que articula o singular ao universal, e expressa determinações históricas e sociais mais amplas do que o singular. Ainda assim, possui especificidades ao mesmo tempo em que é uma categoria intermediária com alguns padrões e relações mais amplas.

Universal - Aqui falamos de uma totalidade estrutural, à lei ou tendência geral que condiciona e se manifesta nos níveis singular e particular. Fala de uma visão mais geral.


NOTA IMPORTANTE SOBRE SINGULAR, PARTICULAR E UNIVERSAL!

Alguns acreditam que essas categorias são separadas, mas eu acredito que não (baseado em muitas coisas kkkkkk nao fui eu que pensei nisso tudo, só estou organizando). Por isso:

É importante dizer que todos essas análises estão RELACIONADAS (dialética) e que o singular só pode ser plenamente compreendido em sua conexão com o particular e o universal, assim como o universal, não existe fora de suas expressões singulares e particulares (ainda que de forma ideal). O particular é essa relação entre o universal e o singular. Até a própria definição de Singular, Particular e Universal se altera a depender da época, do grupo, ou do autor e dos objetivos e recortes que se deseja fazer.

É possível fazer tanto o caminho do universal ao singular quanto do singular ao universal para entender a realidade, CONTANTO QUE possamos ao invés de tratá-las como unidades separadas, as relacionamos.



Enfim, a Universalização.


Finalmente chego a minha crítica. A universalização do particular (ou do singular) no que é considerado humanidade, natureza humana e como isso é um erro porque nos priva de ver outras formas de pensar e lógicas que vão além daquilo que geralmente tomamos como verdade.

A universalização do particular - eu e o outro

Essa parte é mais fácil de visualizar, é basicamente tomar como universal a sua própria experiência individual como se fosse a regra geral da humanidade.

A primeira coisa a se considerar é que não existe NEUTRALIDADE ao considerar o ser humano. Você pode conhecer diversas concepções mas até mesmo não se posicionar é um posicionamento. Dito isso, farei um post só sobre isso também.

Então vamos falar sobre a universalização do particular (ou até mesmo singular).


A universalização do particular - eu e o outro

O exemplo mais clássico a se fazer nesse caso é o do sucesso financeiro, quem cresceu em situação de privilégio econômico pode achar que "pobreza é falta de esforço", e acabar universalizando uma experiência particular de mundo, ou de exceção.

Ou seja,

Pega-se um grupo ou contexto específico (ou sujeito) e o estabelece como norma.

Na minha experiência -> todo mundo é assim -> o mundo funciona assim.

No exemplo dado no curso por exemplo, o homem branco europeu é colocado como o ser genérico no qual todos os outros particulares são vistos >em relação a ele<.

Uma pessoa tida como muito irracional, será comparada (inconscientemente ou não, diretamente ou não) com essa norma. E como essa norma está a cada dia mais inalcançável, cada vez mais pessoas são colocadas dentro de uma lógica de anormalidade (vou falar disso mais pra frente, em outro post), enquanto que em uma perspectiva mais humanizadora de fato, poderíamos aceitar a normalidade justamente como a diversidade. Obviamente, que é preciso criar alguns parâmetros e justamente por isso vou desenvolver isso depois, mas, já adianto aqui que os parâmetros para a criação desse humano genérico universal mais inclusivo está intimamente relacionado com as necessidades da sociedade (atual ou que queremos construir).

Um outro problema da universalização do particular é a questão da empatia. Ao considerarmos que as coisas são como nós vivemos, pode ser difícil fugir de um mero espelhamento e de observar diversas perspectivas. A verdadeira liberdade vêm em aceitar diversas formas da expressão humana. A empatia fica prejudicada em um mundo que não permite diferenças, porque não podemos nos colocar no lugar do outro se o outro está em um lugar "não-lugar" e desumanizado, Ou se todos são colocados em um mesmo lugar, com o referencial de humano do "homem vitruviano".

Em uma perspectiva mais individual, a universalização do particular nos coloca em cheque com as nossas próprias digressões ao que é considerado norma, visto que esse sujeito genérico é inalcançável (e a cada dia que passa se torna ainda mais abstrato).

Podemos universalizar diversas experiências particulares como se fossem universais, por exemplo o padrão de beleza (posso falar mais disso depois também se eu tiver coragem), estruturas familiares (como por exemplo pai, mãe e filhos, desconsiderando por exemplo mães que criam seus filhos sozinhas, casais sem filhos e outras expressões e configurações familiares), todos tem as mesmas 24 horas (desconsiderando que nem todos tem a mesma história ou compromissos). definições de sucesso (como ter um carro ou trabalho que ganhe muito dinheiro), até o fato de tirar ou não os sapatos para entrar em casa.

Todas essas definições existem e muitas pessoas vivem sob essas particularidades, mas mesmo assim elas são particularidades e não refletem toda a diversidade humana. Lembrando que não estou dizendo que devemos destruí-las, o meu convite aqui é não tomá-las como verdades absolutas imutáveis e sim como expressões humanas que podem se diferenciar ao longo do espaço tempo e contexto.

Ou seja, da próxima vez que alguém fizer alguma coisa que se diferencie do que você toma como certo, se questione se não está universalizando o particular e exercite a empatia porque a vida de alguém é única e ainda que estejamos inseridos dentro de uma lógica, não podemos perder de vista que as possibilidades são muitas.

A diversidade de comportamentos humanos EXISTE e o que muda ao longo da história são nossas categorizações acerca dessas expressões. (como já dito, vou falar disso em OUTRO POST). Agora, essa singularidade também se dá de forma mais particular em grupos menos individualizados e esse fenômeno também acontece de forma mais abrangente. Vamos falar um pouco sobre isso.



A universalização do particular - nós e os outros

Quando a universalização do particular se dá por essa lógica de Nós e os Outros, além da lógica Eu e os Outros, caímos em algo ainda mais perigoso, porque por ser algo grupal, temos mais referências de condutas que confirmam os nossos vieses e nos tornam como se fôssemos o "natural". Quando dois grupos se chocam, porém, há (muitas vezes) uma relação de poder imbuída na interação entre os grupos.

Um exemplo disso é a colonização. Muitos (até hoje), acreditam que a colonização das américas (Africa ou Asia também), trouxe benefícios para esses povos porque eles não eram desenvolvidos, no entanto, a própria definição de desenvolvimento se torna questionável a medida que os parâmetros são meramente subjetivos àquela civilização e/ou organização social. A cada dia que passa, porém, torna-se mais difícil desnaturalizar certos comportamentos a medida em que as interações entre diferentes grupos são mais comuns e sofrem mediações cada vez mais centralizadas. A medida em que a cultura humana se massifica e diminui sua diferenciação, torna-se mais difícil a compreensão de que nossos comportamentos não são "naturais". Mas o principal aqui não é estabelecer que as relações humanas são diferentes e sim que elas PODEM ser diferentes. Há semelhanças claro, mas há também diferenças).

Esse fenômeno acontece também em pequenos detalhes que podem passar despercebidos, nesse caso, independente disso é algo que vem primariamente dessa universalização do particular e se transforma nessa massificação. Esses dias vi um vídeo de "comida de rua" x país, eles usavam Nutella para rechear uma massa típica do local, daí, nos comentários tinha um rapaz dizendo que é interessante como o paladar local foi alterado pela Nutella, tanto para atrair turistas quanto pelo "softpower" da Nutella. Obviamente isso é um mecanismo de exageração do processo e se refere mais à massificação mesmo. Mas é mais um exemplo para ajudar a pensar essa dinâmica.

Os hábitos diários particulares à cada cultura também podem ser universalizados como se fosse o natural, como comer arroz e feijão para brasileiros, ou sopa de manhã para algumas culturas, podem ser vistas como algo natural, mas que na verdade são específicas àquela cultura. Até questões de cultura familiar também podem ser vistas como "naturais", quando na verdade não o são. E por que não o são? Simplesmente porque a expressão humana é variada e temos na história diversas formas de existir, desde os hábitos mais básicos até os mais complexos.

A natureza obviamente existe, existem marcadores genéticos, específicos da espécie homo sapiens que nos colocam em posição de espécies, como a organização dos nossos órgãos, etc. No entanto, todas essas determinações biológicas são inseridas em um determinado contexto particular que a relação do singular com o universal.

O próprio conceito de deficiência ou inteligência se torna questionável também nesse sentido, não porque não haja habilidades valorizadas que os seres humanos devem aprender, mas porque esses repertórios são contingentes à necessidade de cada lugar/contexto. A solução seria portanto, peneirar esses repertórios até chegar em um teste de inteligência que contemplasse habilidades até chegar nas mais básicas e elementares e criar um teste que avalie isso e que seja adequado de forma universal OU flexibilizar os testes e adequá-los às necessidades de cada lugar? Não sei. Sei que já existe uma adaptação cultural nos testes, mas será suficiente apenas alterar os símbolos ou seria necessário alterar todo o mecanismo de análise?

É que em última medida, não é só a habilidade que precisa ser pensada significativamente, mas o instrumento e o método que vamos utilizar para a análise. Além de que, toda testagem é uma foto, ou seja, um recorte de um momento, ficando a reflexão: seria o resultado para sempre, imutável?

Quando uma cultura é vista em relação à outra, pode existir o fenômeno do exótico. O que é isso? É quando determinada expressão social é universalizada (e naturalizada), as coisas que se desviam são vistas como exótico (tanto num sentido "positivo" quanto num sentido "negativo"), assim como a cultura universalizada perde seu caráter cultural e ganha um caráter de não-cultura. Um exemplo disso é a cultura estadunidense. Muitas vezes eles são chamados de aculturados, mas isso é um erro, porque apesar de se tornarem referência para inúmeros comportamentos que são vistos em relação à eles, eles ainda são APENAS uma perspectiva. Não existe ser humano sem cultura (além do Mogli).

Ou seja, para finalizar, fica a pergunta final: questione se você toma como universal aquilo que é particular, tanto de forma individual (eu e o outro), quanto de forma coletiva (nós e os outros).




Outras reflexões e desafios.

Os desafios abaixo são apenas para reflexões que podem ser pensadas outro dia.


  • Estatísticas e confianças nas instituições. - Como confiar nas estatísticas? O que as estatísticas nos mostram sobre o universal? Etc

  • Necessidade de pensar as coisas sem pensamento binário. Passagem do simples/linear para o complexo/não-linear.

  • Produção de ciência - como produzir ciência sem cair em universalização do particular? Como pensar o desenvolvimento humano?


Observação - O que estou tentando fazer aqui é uma análise desses fenômenos, criticando-os, mas sinceramente não tenho ferramentas e nem condições de propor alternativas práticas e concretas a esses acontecimentos, visto que é uma coisa complexa. Até porque, para resolver problemas sociais é preciso do social!!! Pessoas!! MUITAS! Todas! Mas cabe a reflexão.

Outro detalhe é que muitas coisas aqui não pensei sozinha (porque essa coisa de pensar sozinha é balela), mas a minha história de vida me possibilitou escutar diversas coisas que por isso escrevi aqui.




Até mais nenéns universais (humanos ou não).


obs. Não tive coragem de ler esse post que eu mesma escrevi kkkkkkk boa sorte pra quem ler.




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